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Sex, 08 Set 2017 10:26:00 -0300
Cadeia Vitoria-Trindade utilizada como modelo para explicar a origem da vida marinha ao redor de ilhas isoladas
Exatamente 50 anos após a publicação da Teoria de Biogeografia de Ilhas, modelo amplamente utilizado para compreender a distribuição e a riqueza de espécies terrestres em ilhas, pesquisadores lançam uma nova teoria que explica a origem e evolução da vida marinha nesse ambiente. O estudo foi publicado hoje no renomado jornal Nature e corresponde a um dos capítulos da tese de doutorado de Hudson Pinheiro, realizado com apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), por meio do programa Ciência sem Fronteiras.Exatamente 50 anos após a publicação da Teoria de Biogeografia de Ilhas, modelo amplamente utilizado para compreender a distribuição e a riqueza de espécies terrestres em ilhas, pesquisadores lançam uma nova teoria que explica a origem e evolução da vida marinha nesse ambiente. O estudo foi publicado hoje no renomado jornal Nature e corresponde a um dos capítulos da tese de doutorado de Hudson Pinheiro, realizado com apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), por meio do programa Ciência sem Fronteiras.
O artigo é assinado, ainda, por Giacomo Bernardi, da Universidade da Califórnia Santa Cruz, onde Hudson cursou o doutorado; do bolsista de Produtividade em Pesquisa 2 do CNPq, Jean-Christophe Joyeuxe e dos pesquisadores Thiony Simon e João Luiz Gasparini, da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES); Raphael Macieira, da Universidade de Vila Velha, além de Claudia Rocha e Luiz Alves da Rocha, da Academia de Ciências da Califórnia.
Para compreender como as espécies se originam nas ilhas, os pesquisadores da UFES primeiro desvendaram a biodiversidade dos ambientes recifais dos montes submarinos e ilhas da Cadeia Vitória-Trindade, localizados na costa capixaba. Esses montes são extremamente isolados e profundos. Assim, a equipe precisou capacitar-se com técnicas avançadas de mergulho e utilizar equipamentos específicos para explorar áreas até 85 metros de profundidade e a 900 km de distância da costa brasileira.
Região costeira da Ilha da Trindade, onde são encontrados a maioria das espécies endêmicas da Cadeia Vitória-Trindade. Foto de João Luiz Gasparini
A proposta da nova teoria veio com o estudo da história evolutiva dos peixes endêmicos da Cadeia Vitória-Trindade, ou seja, estudando as espécies que só existem ali nos montes submarinos e nas ilhas, e em mais nenhuma outra região do planeta. Por meio de parcerias com a Academia de Ciências da Califórnia e a Universidade da Califórnia Santa Cruz, o time de pesquisadores liderado pelo capixaba Hudson Pinheiro estudou o DNA destes peixes para entender a evolução e a origem deles.
"Descobrimos que a maior parte das espécies endêmicas são pequenas, possuem capacidade de migração muito limitadas, e se originaram recentemente. Um número pequeno de espécies terrestres chega nas ilhas, onde acabam diversificando-se para ocupar todos os ambientes disponíveis. No ecossistema marinho, todos ambientes são ocupados por espécies com boa capacidade de se dispersar, e a origem de novas espécies só ocorre quando os peixes com menor capacidade de dispersão chegam nas ilhas", relata Hudson Pinheiro, atualmente pesquisador associado da Academia de Ciências da Califórnia e da Associação Ambiental Voz da Natureza.
Arquipélago de Martin Vaz, as ilhas brasileiras mais distantes da costa e um dos locais estudados na pesquisa. Foto de João Luiz Gasparini
Segundo os pesquisadores, a Cadeia Vitória-Trindade representa um dos poucos ambientes marinhos do mundo onde é possível estudar os processos de evolução nos oceanos. "A distribuição linear dos montes e ilhas da Cadeia, e o isolamento são as principais características que propiciam esse tipo de estudo" diz o Prof. Jean-Christophe Joyeux. "Peixes e diferentes organismos marinhos de águas rasas utilizam os montes submarinos como trampolins, alcançando a Ilha da Trindade. Isso explica a diversidade de peixes na Ilha", completa o cientista. A maioria das espécies que não conseguem se dispersar utilizando os montes são as que vivem nos ambientes rasos ao redor de Trindade. Segundo o Raphael Macieira, "estas são as espécies que ficam geneticamente isoladas e se tornam endêmicas da ilha, sendo somente encontradas lá".
"Estudar a biodiversidade dos montes submarinos da Cadeia Vitória-Trindade era um sonho antigo dos pesquisadores", comenta o pesquisador João Luiz Gasparini. Há mais de 20 anos estudando a biodiversidade marinha de Trindade e da costa do Brasil, o pesquisador sugere que as espécies com baixa capacidade de dispersão só puderam chegar na ilha durante as Eras Glaciais, períodos que o que nível do mar era mais baixo que o atual (até 120 metros), e que os atuais montes submarinos eram ilhas. "A última Era do Gelo terminou cerca de 10.000 anos atrás, e isso explica a origem recente dos peixes de Trindade, que só conseguiram chegar lá utilizando os montes quando estes eram ilhas com ambientes rasos", completa Hudson.
Ambiente submarino do monte Vitória, um dos locais estudados pelo time de cientistas brasileiros que desenvolveu a nova teoria de biogeografia marinha. Foto de Hudson T. Pinheiro
Apesar da importância para a biodiversidade marinha, e agora para o desenvolvimento de estudos científicos com implicância mundial, os pesquisadores estão preocupados com a conservação da região. A Cadeia Vitória-Trindade é alvo de pescarias ilegais de embarcações internacionais. Além disso, as pescarias locais também não são manejadas adequadamente, não existindo cotas e regulamentação para as capturas sobre os montes e nas ilhas. Parte da Cadeia Vitória-Trindade se enquadra no projeto Amazônia Azul, não pertencendo ao território brasileiro. Entretanto, ao invés de utilizarmos esse ambiente único para atividades de desenvolvimento sustentável, como pesca e turismo moderados, empresas brasileiras mineraram por dois anos os topos dos montes submarinos, destruindo os habitats para a produção de fertilizantes, "o que pode trazer consequências irreversíveis para a biodiversidade e processos ecológicos e evolutivos", diz Luiz Alves Rocha.
Cientistas, ambientalistas e pescadores, assim, estão trabalhando em conjunto para mostrar ao governo a importância cultural, econômica e cientifica da região. "Esperamos que a Cadeia Vitória-Trindade possa ser utilizada como fonte de recursos naturais e de desenvolvimento cientifico não só nos dias de hoje, mas também pelas muitas gerações futuras que merecem conhecer e usufruir dessa maravilha natural que é a Cadeia Vitória-Trindade", conclui Hudson Pinheiro.
Veja mais sobre a expedição Cadeia Vitória-Trindade: https://www.youtube.com/watch?v=0FopIi2ZLOM e https://www.youtube.com/watch?v=ZsV3AkDvvvE
Coordenação de Comunicação Social do CNPq